O que é ecumenismo?

Quando o assunto é profecias, a palavra “ecumenismo” sempre vem à mente dos adventistas. Mas essa palavra, tal como usada por católicos e protestantes, tem um sentido mais amplo e complexo do que geralmente supomos. O termo vem do grego οἰκουμένη (oikouméne), que significa “toda a terra habitada”. O sentido básico de “ecumenismo” é “diálogo entre as Igrejas cristãs”, “atitude de abertura para o diálogo, para o conhecimento das diversas tradições cristãs e o reconhecimento da legitimidade destas”. Quando a palavra aparece em notícias, geralmente tem esse significado. O sentido secundário, derivado, se refere às “diversas formas [concretas] encontradas pelos cristãos e pelas Igrejas para levar adiante a busca da unidade cristã” (Wagner Lopes Sanchez, Pluralismo religioso: as religiões no mundo atual [São Paulo: Paulinas, 2010], p. 80, 82-83).

Contudo, mesmo a palavra “unidade” tem um sentido bastante amplo. Aparentemente, nenhum grupo religioso empenhado no ecumenismo espera uma completa unidade institucional de todas as igrejas cristãs. Por exemplo, o Conselho Mundial de Igrejas, fundado em 1948, descreve a si mesmo como uma “comunidade de igrejas”. Portanto, o “Conselho não é em si mesmo uma igreja e […] não deve chegar nunca a ser uma ‘super-igreja’” (ibid., p. 86). (Talvez este seria tópico para outro texto, mas é importante lembrar que a teologia adventista não ensina que todas as denominações cristãs irão se unir em nível organizacional, institucional.)

A posição católica sobre ecumenismo é formada por “ambiguidades”. Por um lado, o Concílio Vaticano II (1962-1965) “reconhece a importância do movimento ecumênico como um conjunto de iniciativas que visam a aproximar as Igrejas cristãs”. A Igreja Católica “reconhece a existência de muitos elementos de salvação fora de suas fronteiras”. Por outro lado, ela possui princípios bastante inflexíveis sobre sua “atuação no movimento ecumênico ao lado das outras Igrejas”. Segundo ela, “as outras Igrejas não dispõem da unidade que foi dada por Jesus Cristo à Igreja católica romana”, e “unidade com a Igreja católica romana supõe a aceitação e a relação com os bispos considerados como sucessores dos apóstolos, tendo à frente o papa”. Assim, para a Igreja Católica, a “unidade do cristianismo terá de, necessariamente, adaptar-se ao modelo eclesial desta”. “Para as demais Igrejas cristãs que não reconhecem a autoridade do bispo de Roma, esses elementos dificultam o diálogo ecumênico, já que colocam um pressuposto que é próprio da tradição católica romana: a existência do ministério episcopal e do papa como articuladores da unidade da Igreja católica romana” (ibid, p. 89, 98, 91-93).

Antes do Concílio Vaticano II, a Igreja Católica defendia que o “caminho a ser percorrido [para a unidade das Igrejas] era o do retorno das demais Igrejas à comunhão com Roma”. A grande ambiguidade é vista no fato de que hoje, embora “a teologia oficial da Igreja católica romana não fale mais em retorno, a visão que ela tem de unidade é uma visão construída a partir de sua eclesiologia vista como modelo fundante da Igreja” (ibid., p. 96-98).

Posição adventista sobre a “igreja de Jesus Cristo”

Aqui é interessante notar que a compreensão adventista sobre a “igreja de Jesus Cristo” pode ser considerada menos exclusivista, mais ‘liberal’ e (por assim dizer) mais ‘ecumênica’ que a das denominações cristãs em geral. Já em 1926, a Associação Geral da IASD votou a seguinte declaração, que permanece até hoje: “Para evitar equívocos ou conflitos em nossos relacionamentos com outras igrejas cristãs e organizações religiosas, estas diretrizes foram estabelecidas: (1) Reconhecemos essas agências que exaltam o nome de Jesus perante a humanidade como parte do plano divino para a evangelização do mundo, e sentimos grande estima por homens e mulheres cristãos em outras comunhões [ou denominações] que se encontram engajados em ganhar almas para Cristo” (“Relationships with Other Christian Churches and Religious Organizations”, em Working Policy of the General Conference of Seventh-day Adventists 2006-2007 [Hagerstown: Review and Herald, 2006], p. 482).

Ángel Manuel Rodríguez, ex-diretor do Instituto de Pesquisa Bíblica da Associação Geral, explica: “Possivelmente um dos questionamentos mais críticos enfrentados por qualquer eclesiologia [compreensão sobre a igreja] é o seguinte: onde reside a plenitude da igreja de Cristo? Os cristãos já deram várias respostas a essa importante pergunta. Os católicos em geral defendem que a plenitude da igreja se encontra na Igreja Católica Romana, em particular na comunhão mútua do papa e dos bispos. As igrejas ortodoxas orientais insistem que a verdadeira ortodoxia foi preservada por eles e, por isso, são a igreja verdadeira, a expressão da plenitude da igreja de Cristo. Os protestantes costumam acreditar que a plenitude da igreja se encontra localizada em diferentes comunidades cristãs nas quais o evangelho e os sacramentos são compreendidos e proclamados de forma clara. [Embora raramente se note, essas compreensões contêm forte tendência exclusivista.] […]

“Os adventistas diferem dessas opiniões eclesiológicas, afirmando que a plenitude da igreja de Cristo não reside em nenhuma organização eclesiástica específica. Não se trata da negação do valor da organização eclesiástica, mas da afirmação de que a igreja não é, por definição, uma estrutura hierárquica. […] [A igreja de Cristo] ‘é composta por todos os que verdadeiramente creem em Cristo’. […] Esse entendimento de igreja não exclui a utilidade de estruturas organizacionais, mas descreve a igreja como muito mais do que um fenômeno institucional. Consiste fundamentalmente de uma comunidade de crentes. […] Essa definição consiste numa rejeição prática do denominacionalismo, já que a igreja em si é descrita como uma entidade que transcende fronteiras denominacionais. A ‘igreja universal’ não é personificada em nenhuma organização cristã específica, mas se encontra espalhada pelo mundo cristão. […]

“A igreja de Cristo é mais ampla do que sua expressão por meio do remanescente [ou seja, a IASD]. […] A igreja se encontra espalhada pelo mundo religioso e não pode ser identificada com nenhuma organização eclesiástica em específico”. Portanto, é apenas na segunda vinda de Cristo que “a união da igreja alcançará sua mais profunda manifestação” (Ángel Manuel Rodríguez, “O remanescente do tempo do fim e a igreja cristã”, em Teologia do remanescente: uma perspectiva eclesiológica adventista, org. Ángel Manuel Rodríguez [Tatuí, SP: Casa Publicadora Brasileira, 2012], p. 211-212, 217, grifo no original).

Leia também: “Onde está a igreja de Cristo?”; “Ecumenismo versus exclusivismo” e “Os três filhos de Abraão”.

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