O cristianismo vai desaparecer?

A década de 1960 foi marcada pelas revoltas dos jovens contra tabus e tradições em religião, política, sexo, música, roupas e muito mais. A longa era cristã jamais havia observado tal explosão de valores, exceto talvez nos primeiros anos da Revolução Francesa.

Os quatro rapazes que formaram os Beatles, o grupo musical inglês, ajudaram a liderar a última revolução. Sua história familiar no porto de Liverpool era mais cristã do que pagã, e os líderes, John Lennon e Paul McCartney, se conheceram em um festival de música promovido por uma igreja, em 1957. Em menos de uma década, os quatro rapazes se tornaram os mais festejados do mundo. Milagrosamente, eles dançaram ao longo de uma tênue linha transparente que separava os valores cristãos tradicionais dos valores expostos em discotecas e concertos de rock. Em 4 de março de 1966, John Lennon cruzou aquela linha. “O cristianismo vai morrer”, ele anunciou. “Vai encolher e desaparecer. Hoje somos mais populares do que Jesus Cristo.” Nos círculos nos quais ele transitava, a observação estava correta.

O cristianismo está em declínio nas nações mais prósperas, mais instruídas e mais materialistas, mas não em outros lugares. No entanto, mesmo na Europa, o centro do cristianismo, o declínio ainda não pode ser considerado permanente. No curso de 20 séculos, ele já entrou em declínio e se recuperou várias vezes. No ano 300, estava mais fraco na Europa e na Ásia Menor do que hoje. Em 1600, estava mais fraco no mundo como um todo. A conclusão deste livro é que o cristianismo se reinventou repetidas vezes. Todo renascimento religioso é o reflexo de um estado de declínio anterior. Mas nenhum renascimento — e talvez nenhum declínio — é permanente.

Mesmo quando o cristianismo atravessava uma boa fase, muita gente permanecia indiferente ou pouco interessada, e sua influência em muitos setores da sociedade era fraca ou irregular. Conforme João Calvino confessou, o fato de Genebra ser a vitrine do cristianismo não significava que todos os habitantes do local acreditassem nas principais verdades religiosas. Eles creditavam à sorte, ao acaso e ao destino tudo que lhes acontecia: “Se uma ventania repentina afunda a embarcação; se alguém é derrubado por uma árvore que caiu sobre a casa.” Segundo Calvino, “essa opinião errônea atravessou os tempos, e é praticamente universal”. Em essência, o mundo ocidental atual não deve ser comparado com muito rigor à supostamente mais cristã civilização que o precedeu. O cristianismo, mesmo no apogeu, para muita gente foi, em parte, só aparência.

Geoffrey Blainey é professor na Universidade de Harvard e na Universidade de Melbourne. Retirado de Uma breve história do cristianismo (São Paulo: Fundamento, 2012), p. 327-328.

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