Paulo contra o sábado?

O estudo mais importante já publicado contra o sábado e/ou em defesa do domingo intitula-se Do Shabbath para o Dia do Senhor (São Paulo: Cultura Cristã, 2006). Esse livro, que tem 450 páginas, foi escrito por vários eruditos evangélicos e organizado por D. A. Carson, um dos mais renomados especialistas em Novo Testamento. A obra conclui que Romanos 14:4-5; Gálatas 4:10 e Colossenses 2:16 não podem ser usados para provar que o sábado foi abolido e que fazer isso seria ir muito além do que os textos dizem (exegese).

Os comentários evangélicos em geral parecem chegar à mesma conclusão. Certa vez pesquisei uns 30 comentários de Colossenses. E nenhum comentário acadêmico defendia que Colossenses 2:16 prova que o sábado foi abolido.

Sobre a lei, seria até redundante fazer alguma observação. Nenhuma denominação cristã séria e nenhum estudioso sério acreditam que os Dez Mandamentos foram abolidos.

Penso que esse seja um ótimo rumo para defender a validade da lei e do sábado. Os apologetas evangélicos populares que usam Colossenses 2:16 e outros textos como argumentos decisivos contra a guarda do sábado estão simplesmente indo na contramão do mundo teológico evangélico.

Então, como compreender Colossenses 2:16-17?

Colossenses 2:16-17 é um dos textos mais usados contra a guarda do sábado. Nessa passagem, lemos:

Ninguém, pois, vos julgue por causa de comida e bebida, ou dia de festa, ou lua nova, ou sábados, porque tudo isso tem sido sombra das coisas que haviam de vir; porém o corpo é de Cristo.

Atualmente, a maioria dos estudiosos adventistas acredita que essa passagem se refere ao sábado semanal, e não aos sábados cerimoniais. Abaixo, estão duas citações que apresentam a melhor explicação que já encontrei sobre essa passagem bíblica.

Algumas passagens de Paulo consideradas como se referindo à observância do sábado se referem, em vez disso, aos sacrifícios, como Colossenses 2:16. […] Sempre que essas expressões (“festas, luas novas, sábados”) são usadas juntas no Antigo Testamento, elas se referem aos holocaustos oferecidos nesses dias ([Nm 28–29] 1Cr 23:31; 2Cr 2:4; 8:13; 31:3; Is 1:13-14; Ez 45:17; 46:4-11; Nee 10:33; Os 2:11). Neemias 10 é especialmente interessante, porque esse capítulo fala tanto sobre a guarda do sábado (v. 31) como sobre os sacrifícios sabáticos (v. 33), mas apenas no versículo 33, que trata dos sacrifícios, é que encontramos a expressão tríplice usada em Colossenses. Essa frase se refere aos sacrifícios semanais, mensais e anuais de Números 28 e 29.

Em Números 28:2, lemos: “Da Minha oferta, do Meu manjar para as Minhas ofertas queimadas, do aroma agradável, tereis cuidado, para Mas trazer a seu tempo determinado”. Então segue-se uma descrição dos sacrifícios diários (v. 3-8), semanais/sabáticos (v. 9-10), mensais/da lua nova (v. 11-15) e anuais/das festas (28:16–29:38). Essa interpretação é a única que faz sentido à luz de Colossenses 2:17, que diz: “[…] porque tudo isso tem sido sombra das coisas que haviam de vir; porém o corpo [em grego, soma] é de Cristo”. É o serviço do santuário que era uma sombra (Hb 8:5).

O paralelo mais próximo de Colossenses 2:16-17 é Hebreus 10:1-9, que usa muitas das mesmas expressões: “A Lei traz apenas uma sombra dos benefícios que hão de vir, e não a sua realidade. Por isso ela nunca consegue, mediante os mesmos sacrifícios repetidos ano após ano, aperfeiçoar os que se aproximam para adorar. […] Por isso, quando Cristo veio ao mundo, disse: Sacrifício e oferta não quiseste, mas um corpo Me preparaste. […] Ele cancela o primeiro para estabelecer o segundo”. Colossenses 2:16-17, portanto, é uma versão resumida do argumento de Hebreus 10. Até a “comida e bebida” de Colossenses 2:16 está relacionada ao serviço sacrificial (cf. Hb 9:9-10; Nm 28:24). – Tim Crosby, “The Apostolic Church and the Ten Commandments (Part 2)”, Ministry, abril de 2005, p. 15.

“Sombra das coisas que haviam de vir” (Cl 2:16-17). A frase “dia de festa, ou lua nova, ou sábados” é uma referência idiomática ou estilizada aos sacrifícios cerimoniais oferecidos no antigo santuário ou templo israelita. O pano de fundo do Antigo Testamento se encontra em Números 28 e 29, em que são mencionados os holocaustos diários, semanais, mensais e anuais. Havia cinco festas anuais que abrangiam sete sábados cerimoniais. [Várias] passagens do Antigo Testamento usam alguma forma da expressão “festas, luas novas, sábados” (1Cr 23:29-31; 2Cr 2:4; 8:12-13; 31:3; Ne 10:33; Ez 45:13-17; 46:1-15; Os 2:11; [cf. Ed 3:5; Sl 81:3; Is 1:14]). Cada uma dessas passagens se refere aos holocaustos a serem oferecidos semanal, mensal e anualmente. Em geral, a palavra “festas” designava somente as três festas de peregrinação (Pães Asmos, Pentecostes e Tabernáculos). […]

Em Colossenses 2:16 e 17, Paulo ensinou que os sacrifícios oferecidos semanal, mensal e anualmente eram uma “sombra” que apontava para Cristo (cf. Hb 8:5; 10:1) e perderam sua significação na cruz. […]

A “comida e bebida” diz respeito às ofertas de manjares e de bebidas que eram apresentadas a Deus junto com os holocaustos (cf. Nm 28:2, 5, 7, 9, 13-14). – Lição da Escola Sabatina, julho-setembro de 1994, p. 124-125 (28 de agosto).

Para estudo adicional, veja Edwin Reynolds, “‘Let No One Judge You’: Col 2:16-17 in Exegetical Perspective”, Journal of the Adventist Theological Society, 2009, p. 208-222.

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